segunda-feira, agosto 31, 2009

Um rosto (des)conhecido

Certa vez levei minha irmã mais nova, portadora de síndrome de Down, para a aula de dança. Cumprimentei a professora e os coleguinhas do grupo de dança. A professora dava aula de graça para crianças portadoras de necessidades especiais. Sempre admirei o trabalho voluntário dessa jovem professora. Quando a aula de dança começou, sentei num banco que ficava de frente para a sala com vidros transparentes onde minha irmã dava os seus passinhos. Como a academia oferecia outras atividades físicas, observei as pessoas que faziam exercícios. De vez em quando, olhava para a minha irmã. Num certo momento, o meu olhar se dirigiu para a área de musculação e notei um homem fazendo exercício com os braços em um aparelho de ginástica. Ele sorriu e acenou para mim. E fiz o mesmo para ele. Percebi que ele me conhecia e eu não sabia de onde já o vi. Tinha porte atlético, cerca de 50 anos de idade, cabelos e barbicha branca, e era alto e bronzeado. Por mais que me esforçasse, eu não conseguia me lembrar dele. Fiquei frustrada com a minha fraca memória. Eu tinha certeza que era um rosto conhecido, inclusive que já o havia entrevistado quando era estudante de jornalismo. Após o término da aula de balé, voltei para a minha rotina diária e esqueci o homem. Dias depois, estava lendo o jornal de minha cidade quando meus olhos se fixaram em uma página. Lá estava a foto dele. A do rosto que eu tanto tentei me lembrar no dia do balé da minha irmã. De fato, eu o havia entrevistado para uma reportagem da faculdade. A matéria tratava sobre estabelecimentos tombados da cidade onde eu vivia. O homem era um arquiteto muito conhecido e trabalhou em diversos órgãos públicos. Quando o entrevistei, ele atuava como assessor urbanístico da Câmara de Vereadores. A entrevista foi muito boa, pois ele respondeu a todas as perguntas com muito profissionalismo e conhecimento profundo sobre o urbanismo da cidade. O jornal que eu lia naquele dia estava noticiando que o arquiteto foi encontrado morto no apartamento em que morava sozinho. Ele teve infarto fulminante. “... deixou dois filhos...” E me deixou em estado de choque e depois caí num choro compulsivo. “Como pude esquecer aquele homem...” Não gosto de esquecer de uma pessoa com quem conversei bastante, mesmo que tenha sido por um dia apenas. No dia do balé da minha irmã perdi uma oportunidade de conversar outra vez com ele. O que chamou a minha atenção nesse homem no dia da entrevista foi a sua paixão pela cidade de Joinville. Ele era baiano e conhecia muito bem o lugar que escolheu para morar. Melhor do que eu, que sou natural de Joinville. Ele lutava para deixar a cidade mais bonita e boa de viver. Dava para ver nos seus olhos o orgulho que ele tinha por Joinville. E isso faltava em mim. Ele se foi e me deixou uma lição de amor pela cidade.

2 comentários:

  1. Nossa, que post interessante! me fez pensar bastante, e lembrar de várias entrevistas que fiz na época da faculdade também...hihihih

    Beijos e boa semana (de sol, pleaaaaase!)

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  2. Que bom, Carla! Boa semana pra você também! Aqui o sol está maravilhoso, mas a previsão é de chuva a partir de quarta-feira. Beijos!

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