quarta-feira, dezembro 06, 2006

Acidente de trabalho

- Amor acorda. Amooor.
- Hum! Que foi? – respondeu ainda dormindo.
- Ouvi um barulho lá embaixo.
- Não é nada. Volta a dormir.
- Eu tô com medo. Eu não vou dormir e nem vou deixar você dormir enquanto você não descer lá e olhar as portas e janelas e me garantir que não tem nada de errado lá em baixo.
Aquelas palavras foram o suficiente para que ele perdesse a esperança de voltar a dormir. Sabia que ela falava sério. Era uma de suas qualidades e também o seu maior defeito. Depois que colocava uma idéia na cabeça ninguém a convencia do contrário.
- Tá bom eu vou ver o que está acontecendo. – sentou-se na cama e esfregou os olhos com as costas da mão. Os pés tateavam o chão frio em busca das havaianas. Olhou pro rádio relógio e não acreditou no que via. Eram 04h00min da manhã e ele teria de sair da sua cama quentinha só para satisfazer os desejos paranóicos da esposa. Levantou-se em silêncio. Levava a mão ao interruptor de luz quando ouviu um barulho vindo lá de baixo. Recolheu a mão assustado.
- Eu disse que...
- Psshii. Fica quieta. – sussurrou.
Ainda na escuridão caminhou ao guarda-roupa suas mãos avançaram pela roupa macia. Remexeu de um lado para outro até que achou e retirou o seu revólver novo. Um trinta e oito. Bulldog. Cromado. Balançou a arma na mão para sentir-lhe o peso. Gostou do que sentiu. Tirou os pés de dentro das sandálias. Descalço e com passos leves deslizou pra fora do quarto. Pensou na esposa que deixava pra trás e na filha que dormia no quarto ao lado. Faria o que fosse preciso para mantê-las a salvo. Com certeza era um vagabundo bêbado ou drogado. Talvez fosse “de menor”. Nesse caso, se, detê-lo até a chegada da polícia eles o levaram e em um ou dois dias ele estará solto de novo. Voltará aqui e ameaçará minha família. Não posso deixar isso acontecer. O melhor a fazer é atirar primeiro, perguntar depois. Nas aulas de tiro o professor sempre repetia “É melhor ser julgado por sete do que carregado por seis”. Verificou o quarto da pequena. Agradeceu a Deus por ela estar dormindo tranquilamente. Pousou uma mão no apoio da escada. Com a outra apontava a arma lá pra baixo. Foi descendo le baixo. Foi descendo lentamente. Atento. No silêncio predominante o som da própria respiração o incomodava. Parecia que seria denunciado por ela a qualquer instante. O dedo já repousava no gatilho. Suava profusamente. Seus olhos já estavam mais acostumados à escuridão. Nas trevas percebeu uma silhueta. Ela parecia ajeitar coisas dentro de um saco. Bandido safado. Sentiu o ódio subir-lhe a cabeça. Não pensou mais. Passou fogo no intruso.
-Aih! – foi o último som emitido pelo invasor. Seu corpo tombou pesadamente no meio da sala.
Com o barulho a criança acordou chorando. A esposa gritava assustada. Ele ouviu os passos lá em cima. Correu e acendeu a luz.
- Puta que pariu!
- Oh! Meu Deus! – ela correu pra abraçar a filha.
- Mamãe! Mamãe! Papai matou o Papai Noel.
Noel morreu a trabalho na madrugada de Natal.

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