Volta e meia isso me acontece, estou andando pela rua, dia comum, nada de especial, não depende de eu estar triste ou feliz, simplesmente acontece. Estou seguindo pela rua ela vem e toma de assalto meus pensamentos. A falecida, ela faz questão de não me deixar em paz, mesmo após tanto tempo. Não que seja ruim relembrar nossos momentos juntos, pois não sei por que todas as memórias que aparecem são dos momentos bons que passamos lado a lado. Passeios, jantares, viagens e sexo. Muito sexo. Talvez seja simplesmente algum tipo de perversão mórbida, um jeito de profanar quem descansa em paz. Mas não são apenas simples lembranças, também tem momentos em que surgem em minha mente imagens que não foram vividas, são simplesmente sonhos que poderiam ter se tornado verdade se tivessemos mais tempo juntos. Uma que é renitente e faz parte daquelas que eu mais gosto é aquela em que a vejo com um enorme barrigão de gestante, lindo, redondo, pleno de vida. Na minha cabeça eu a vejo como numa foto de propaganda de seguro de vida ou de saudação de ano novo. Creio que essa seja a que mais mexe comigo.
Essas lembranças não chegam a me incomodar, pois como eu disse são todas de momentos bons, mas mesmo assim não deixa de ser estranho, ficar revivendo o passado quando menos se espera.
Depois de tantos anos eu não esqueço mais o aniversário dela, Deus sabe quantas brigas tivemos por causa do meu esquecimento para com uma data tão importante. Não posso passar em frente à loja de jóias que me uma vontade de entrar e escolher um colar para presenteá-la. E hoje que não faz mais diferença alguma o lembrar ou o esquecer, Hoje essa data não abandona minha memória.
É meio ridículo quando você olha pra traz e vê quanto erros tolos cometeu e por isso fizeste alguém sofrer. Quanta dor poderia ser evitada com um pouquinho mais de maturidade, uma pequena dose de coragem e uma gota que fosse de amor.
Quando chego em casa, de noite, sozinho, no meu quarto, sentado na cama vejo fotos, como ela sorria ftos, como ela sorria fácil, ainda trago a foto 3x4 dela na minha carteira, creio que nunca vou me desfazer dela. Agora durmo agarrado com o travesseiro por que ela não esta mais aqui, não me sinto triste, quando muito, às vezes me sinto só.
Fora essas memórias que me visitam constantemente, não posso esquecer, jamais da minha imaginação, que volta e meia quando a deixo livre põem-se a sonhar possibilidades e futuros que hoje poderiam ser realidade. Mas diante do sonho da casinha branca, com gramado na frente, crianças correndo no quintal e nós preparando o almoço do domingo, lembro-me que a vida é uma existência feita de escolhas. Não cabe agora ficar se lamentando pelos erros do passado. Resta apenas, tocar a vida em frente.
E é Isso que vou fazer, vou tocar a vida em frente. E se as memórias dela continuarem a me perseguir eu ligo para ela e marco um jantar para nós dois.
Afinal estamos separados, mas não estamos mortos.
P.S: Eu escrevi isso há muito tempo. Roubaram-me a 3X4. Certas coisas mudaram, outras não. Não há mais coragem pra ligar. Não há mais por que espalhar dor por ai. As memórias continuam. Elas não morrem. Mas agora certas coisas mudaram.