segunda-feira, junho 23, 2008

Poesia em Blumenau


Noite de quarta-feira. Caminho sozinho pelas ruas. Quase todos estão em suas casas aquecendo o corpo e congelando as mentes em frente a televisão. A caminhada e as taças de vinho que tomei ajudam a esquentar. No bolso direito do sobretudo levo minha velha e cega faca. Companheira do dia a dia e principalmente das caminhadas noturnas. O tempo está frio. Oficialmente o inverno começa daqui a dois dias. Mas não é o que dizem as pontas dos meus dedos. Depois de 45 cinco minutos de caminhada chego ao meu destino.
Uma amiga da internet me deu a dica. Um bar com música e poesia ao vivo. Poesia nunca foi a minha praia, mesmo assim é uma chance de mudar de ares. Afinal pedra que rola não cria limo. O bar tem um aspecto bacana com aquecedores e lugares aconchegantes. Escolho uma mesa, peço uma água com gás e relaxo apreciando a música. Ao redor o tipo de gente cult da faculdade. Cabelos estranhos e aquele ar de intelectual. A música é boa. Sou um estranho em terra estranha. Ninguém se aproxima, muito menos tento estabelecer contato. O tempo passa e aparecem os poetas e de tudo que ouço se salva apenas a performance e a seleção de poemas feita por um escritor local, Maicon Tenfen, dois do Augusto dos Anjos e um do Vinícius de Morais.
Fiquei ali por umas duas horas entre músicas poesias e tudo o que posso dizer é que as músicas próprias apresentadas pelos blumenauenses tocaram-me muito mais que as poesias criadas por eles.
No retorno ao hotel minha caminhada foi interrompida cinco vezes por drogados que pediam uma ajuda pra comer, pra pagar o ônibus, pra comprar remédios e todas essas mentiras que eles contam quando estão na fissura.
Abaixo estão os poemas que me agradaram.


De Augusto dos Anjos:

Versos íntimos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te a lama que te espera!
O Homem que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera

Toma um fósforo, acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro.
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa ainda pena a tua chaga
Apedreja essa mão vil que te afaga.
Escarra nessa boca de que beija!



Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!


De Vinícius de Morais

Soneto da fidelidade

“De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.”

14 comentários:

  1. Guapo, fico com o último poema... Vinícius é sempre Vinícius....

    Besos, besos...

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  2. Enxaqueca apesar do poema dele ser muito belo gostei muito mesmo de conhecer algo que pra mim era novo. E naquela noite o que me chamou a atenção foram mesmo os poemas o Augusto dos Anjos.
    Besos chica.

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  3. Amo Psicologia de um vencido...

    Noite fria... muito fria, eu acho, não?!

    Boa semana

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  4. Menina da lua não digo que amo, mas gostei muito de conhecer essa poesia. Ela sai um pouco do estou acostumado a encontrar por ai a fora.
    Um abraço.

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  5. Adorei o poema do Vinicius de Morais..o homem sabia das coisas e como escrevê-las.
    Mudei de endereço, se quiseres passar por lá, estou em http://omeuvoonocturno.blogspot.com
    Bjks,
    Clara

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  6. Um dia quero conhecer Blumenau.
    Dos poemas o último é meu preferido.
    Beijo!

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  7. Bem, vc fala que vinha com duas taças de vinho e no bar onde foi diz que bebeu água! Como é? já tava toldado? ehhhhhh.
    Beijinho pra vc moço lindo...laura..

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  8. Quero vivê-lo em cada vão momento.....

    saudades daqui, beijos

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  9. Andreia obrigado. Seu desejo funcionou. Realmente foi uma ótima semana.
    Beijos.

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  10. Clara ainda hoje eu passo por lá.
    Beijos.

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  11. Babi assim que puder apareça por lá. A cidade realmente vale a pena.
    Beijos.

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  12. Laurinha o vinho eu comprei no mercado e bebi no hotel. A água eu tomei bar. Assim gastei bem menos.
    Beijos.

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  13. Verônica as portas estarão sempre abertas pra você.
    Beijos.

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